É difícil cuidar do cabelo cacheado?
- Tai Cruz
- 6 de out. de 2020
- 5 min de leitura

Se vocês acompanham os textos e resenhas do universo capilar que publico por aqui, já sabem que o meu objetivo ao falar de cabelo tem muito mais a ver com autonomia e autoconhecimento do que com métodos e cronogramas. Apesar de não ter feito transição, passei por um processo de redescobrimento do meu cabelo natural.
Durante esse tempo, ouvi muitas (e muitas) vezes sobre como aquilo era trabalhoso demais. Os "pitacos" vem de todos os lados: “dá muito trabalho”, “é complicado de cuidar”, “é mais prático escovar e pranchar”, “demanda muito tempo”, “penteou o cabelo hoje?” “posso pegar?” ou o clássico “vamos fazer uma escova para ficar mais arrumado”. Digo isso com consciência que os cachos 2-B 3-A que carrego ainda são colocados dentro do padrão. Quando a curvatura aumenta, a história fica muito mais pesada (muitas vezes preconceituosa e ofensiva).
O padrão nunca estará satisfeito. Existe um legado patriarcal e capitalista que deseja controlar até mesmo o tamanho e o formato dos nossos cabelos. A linha entre o controle e a vontade é tênue. E fazer prevalecer a sua vontade é um embate de aceitação. Mas que fique claro: não é como se as mulheres que resolvem assumir a relação com seu cabelo natural fossem seres superiores. Não são. Acho que o importante é reconhecer seus próprios desejos, e o quanto eles podem ser mutáveis. Ser honesta com a sua história e necessidades e não com o que te vendem como o mais bonito. Uma jornada que pode ser um tanto quanto difícil, mas libertadora.
Além do mais, o capitalismo já deu um jeito de inserir sua toxicidade na aceitação do cabelo natural. Pra mim, tudo começou com esse slogan: “em terra de chapinha, quem tem cachos é rainha”. Tudo tem que sempre girar em torno de uma competição feminina? O movimento natural tá bem longe de superar os anos do padrão estético liso. Mesmo assim, a cultura já se ocupou de transformar isso em um status competitivo.
Quem tá começando agora pode estar se sentindo em um furacão de informações e produtos novos. Lamento muito que isso faça com que algumas desistam antes mesmo de começar. Mas olha, você não precisa saber de tudo. Com uma finalização adequada ("tudo na vida da gata") e os produtos certos você já consegue bons resultados. Que o cabelo é uma ciência experimental é fato. Um misto entre autoconhecimento e teoria. Mas, conhecer seu cabelo profundamente vai sim exigir de você uma nova rotina. Uma máscara de tratamento aqui, um pré-shampoo acolá. As coisas se encaixam.
Algumas de nós realmente tem interesse em mergulhar nesse mundo. Entender métodos, rótulos, ingredientes e produtos. Eu me encaixo nesse grupo. Sou uma curiosa incurável, tenho tesão em descobrir um assunto novo pra estudar. Com meu cabelo não seria diferente. A vantagem é que quanto mais você se aprofunda no seu cabelo, mais você controla os resultados alcançados. Mas nem todo mundo é assim. Muitas mulheres estão interessadas apenas em uma finalização que não demore horas, nem desmanche tão fácil no dia seguinte. Tem espaço para todo mundo.

Quero dizer que você não vai ser menos ondulada/cacheada/crespa (ou evoluída) porque não reconhece ingredientes “proibidos” em uma máscara de tratamento. O advento da internet e das informações parece imputar em nós uma obrigação de saber de tudo. E ter milhares de produtos. Talvez isso cause ansiedade em pessoas que estão se redescobrindo. Vai no seu tempo. Eu comecei comprando um creme de pentear e uma hidratação. Tudo que eu sei sobre cabelo hoje, eu aprendi durante anos, principalmente de observação do meu cabelo. Observação pra mim é a fonte de conhecimento que você nunca deve parar de beber.
Sabe o que tem no meu banheiro agora? Uma hidratação, um óleo e um creme de pentear. E consigo alcançar ótimos resultados assim. Aproveito pra testar recursos naturais como Aloe vera (babosa), azeite, gel de linhaça. Se o cabelo pedir outro tipo de tratamento mais potentes (nutrição, reconstrução...), eu providencio. Não se apega às regras. Elas estão no mundo para serem quebradas. Também não ache que existe solução mágica. Quem produz conteúdo não vai dar conta de analisar seu cabelo individualmente. Isso se chama consultoria e deve ser um serviço profissional e pago. Foca em conhecer o seu cabelo que o resto vai simplesmente acontecendo.
Eu sempre gostei de cabelo curto. Comecei aos 16 e desde então, passei a maior parte do tempo assim. Hoje eu sei que foi a primeira vez que fiz algo que eu realmente desejava fazer. Totalmente oposto ao que as pessoas queria "sugerir". Em meados de 2016 eu fiz uma promessa e resolvi deixar crescer. No meio do caminho eu percebi que estava realmente em outra fase. Queria ter aquela experiência de ver meu cabelo longo, compreendido e bem cuidado. E assim aconteceu, e foi importante ter vivido isso. Fui apresentada a aspectos meus que desconhecia. Mas hoje, eu troquei de estação.
Em 2019 minha vida deu um giro 360 e tudo que eu menos queria era ter que me preocupar com os cuidados de um cabelo grande. Sim, cabelo grande cacheado dá trabalho. Qualquer cabelo grande, dá: Digo por mim: 1. meu cabelo fica pesado e portanto fica menos definido; 2. preciso manter as camadas (corte) em dia; 3. gasto maior de produtos (tava pra usar 3 tubos de tinta); 4. demanda tempo e paciência para lavar e 5. embaraça com a mais leve das brisas e fica com muitos nós para tirar no banho.

Então entendi que era hora de voltar ao lar. Cortei. Mas fiz um corte mais socialmente “aceitável”, no ombro. A satisfação durou poucos meses. Eu sabia que eu queria mais. Eu precisava revisitar aquele lugar novamente. A nunca livre, leve e solta. O redemoinho estranho e fofo ao acordar. A praticidade de lavar todos os dias se quiser. Levar 2 minutos para arrumar. Mesmo assim passei meses insatisfeita com o que eu via e sem querer mudar.
Dizia pra mim mesma: você sabe o caminho, é só seguir. Mas eu protelei tanto. Pensei na opinião das outras pessoas. Pensei que elas diriam: porque você vai falar de cabelo cacheado se cortou quase todo? Na semana que eu marquei o salão, fiquei mais ansiosa que nunca. Já banalizei mentalmente quando as pessoas dizem que é preciso coragem de cortar. Paguei a língua mais uma vez. Meu cabelo nem estava mais longo, e eu precisei de coragem pra romper a bolha. Cortei. Não posso descrever o quando foi delicioso me reconhecer de novo no espelho.
Um tempo atrás eu disse que ia lançar a campanha “viver dá frizz”, pra ver se a gente consegue naturalizar esse negócio (risos). Você não precisa amar e cultivar o frizz. Mas bem que a gente podia começar a entender que é algo totalmente natural né? Pessoas com frizz no cabelo não são descuidadas e muito menos desarrumadas. Só estão vivendo seus cabelos naturais. Tem gente que gosta do cabelo definidinho, outras que amam volume. Tem as que abominam frizz e outras que convivem bem com ele. Meu lema hoje em dia é menos regras e mais experiências. Você tem o poder de escolha nessa relação.
Não é fácil apreciar o processo. Ficar com duas texturas, cortar curtinho pra tirar o liso, lidar com o julgamento alheio. Mexe demais com nossa construção e auto estima. Mas dói bem menos quando a gente não rema contra a natureza das coisas e tenta abraçar as nossas fases (boas ou ruins).
Com ♥, Tai.
Nota mental: Que tipo de ondulada/cacheada/crespa você quer ser? Um só? várias dentro de uma?
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