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Entre ciclos e arquétipos: Descubra sua Deusa interior

  • Foto do escritor: Tai Cruz
    Tai Cruz
  • 25 de jun. de 2020
  • 10 min de leitura

Atualizado: 21 de set. de 2020


O ano é 2015, o mês outubro. Finzinho dos 21 anos. A idade da sorte, eu dizia quando era criança. O dia que eu nasci sempre foi sagrado pra mim, portanto 21 é meu número da sorte. Era a idade que eu sonhava alcançar, na qual eu imaginava o auge da minha vida adulta. Profissão bem sucedida, casamento e 2 filhos. Obviamente nada do que eu esperava aconteceu aos 21 anos. Entretanto, essa foi uma idade decisiva para os meus próximos anos de vida.


Parafraseando Renato em Eduardo e Mônica: “Ela aprendeu a beber, deixou o cabelo crescer e decidiu trabalhar, nãoooo”. Aos 21, eu amei, tomei meu primeiro porre (de mojito), me formei,

chorei, viajei para lugares incríveis, criei barracos inesquecíveis, entrei no mestrado, ganhei meu primeiro cachorro, fui morar sozinha, errei, acampei pela primeira vez e nos 45 do segundo tempo, eu decidi parar de tomar anticoncepcionais. Parando para pensar, foi bem melhor do que eu tinha planejado quando criança.


Parar de tomar anticoncepcional foi uma das decisões mais difíceis que já tomei. Porque ao mesmo tempo em que eu desejava me livrar dos possíveis riscos e do efeito castrador, eu tinha medo de entrar em uma nova prisão: a paranoia de engravidar. Foram meses de estudos e aprofundamentos em um tipo de conhecimento que as mulheres só têm acesso através de outras mulheres ou dentro de si. A porta de acesso é fora do mundo acadêmico sabe?

Eu mencionei essa mudança em outro texto aqui, e contei um pouco sobre como ela desencadeou meu processo de autoconhecimento. Contei também porque eu deixei isso gravado na pele. Se você quiser ler, o link está aqui: https://www.enguicocomfeitico.com.br/post/o-autoconhecimento-%C3%A9-a-abertura-e-o-desenlace-da-sua-liberdade

Aproveitei que a lua está vermelha aqui e que a anciã está cochichando no meu ouvido enquanto limpa meu útero para falar mais especificamente sobre o lado cíclico dessa descoberta. Até o final desse texto você vai entender. Quero te contar como foi descobrir as dores e delícias de ser cíclica e de fazer as pazes com a minha menstruação. A menarca chegou aos 11 anos e eu estava sozinha em casa. Coloquei um paninho e corri na minha vó, que por estar na menopausa não tinha as ferramentas necessárias (vulgo absorvente) para me salvar.


Obviamente todos da família ficaram sabendo que eu “virei mocinha”, que vergonha. E desde então vivemos uma relação odiosa de cólicas, vazamentos noturnos e incômodos. Comecei a tomar anticoncepcional aos 19, antes mesmo de perder a "virgindade". Eu marquei a consulta, e com o incentivo da médica, resolvi que queria começar. Portanto parar também precisava partir de mim. Continuei “menstruando” (o sangue mensal da pausa é um sangramento por privação hormonal e não menstrual) por todos os anos de contracepção hormonal, exceto nos últimos 2 meses antes de parar. Esse foi o sinal.


Nesse meio tempo, minha relação com esse sangramento mensal ia de mal a pior. Depois de usar um lubrificante de origem duvidosa (bolinhas que explodem no sexo?), desenvolvi uma alergia terrível. O período menstrual + absorvente externo se tornou um verdadeiro filme de terror. Em outros tempos talvez eu tivesse ficado feliz em parar de sangrar. Mas aos 21, esses dois meses secos, por assim dizer, me soaram como um alerta. “É chegada a hora de se resgatar”, e eu embarquei. Além de eliminar essa fonte externa de hormônios que estava bagunçando o andamento da minha vida sexual, eu também abandonei outra coisa: os absorventes.

Começamos do zero: eu, minha lua vermelha e meu coletor menstrual. E aqui reconheço meu privilégio de poder escolher conscientemente como conduzir essa relação. A educação sexual no Brasil é precária e taxada de imoral. Muitas mulheres não conhecem seus corpos e nem mesmo o funcionamento dos métodos contraceptivos. Outras tem síndromes ou sintomas intensos que as levam a optar pelos métodos hormonais. Muita não tem acesso a um simples absorvente (usam jornal, areia, cinzas miolo de pão e até cocô de vaca no lugar).


Sou grata por ter acesso à informação e pelo meu poder (que também é aquisitivo) de escolha. Ao longo desses anos aprendi que isso não me dá o direito de julgar a escolha da outra. Desejo apenas que sua escolha seja consciente, dentro das suas possibilidades. Não quero que essa seja mais uma narrativa romântica e excludente. Esses dias li um texto de Yasmin Bendito que dizia o seguinte: Tudo dói. Se encaixar num padrão, se relacionar, parir. Por isso o feminino deve vir para curar e não para criar um novo padrão colonizador e cheio de segredos. Todas podem ser livres e selvagens. Talvez essa conversa te apresente esse caminho.

Fomos culturalmente acostumadas a olhar o nosso ciclo apenas sob a perspectiva da menstruação (fase odiosa e dolorida). Com isso, deixamos de lado todas as outras fases que complementam nosso ciclo. Fases essas que nos deixam comunicativas, sexuais e criativas. Temos tempos de plantio e de colheita, como as estações. Aprender a olhar o ciclo com um todo é como desenhar um mapa exclusivamente seu.


Biologicamente falando, o ciclo menstrual é uma série de transformações que ocorrem no útero, dentro de um período aproximado de 28 dias (com variações que podem ir de 20 a 40). Começa no primeiro dia da menstruação e acaba quando o próximo ciclo começa. Cérebro, ovários e útero trabalham juntos nessa empreitada. É muito mais do que apenas sangrar. Dividimos o ciclo em três fases: proliferativa (folicular), secretora (lútea e ovulatória) e menstrual.

Os contraceptivos hormonais atuam impedindo a ovulação, portanto interrompem o restante do ciclo também. Sem a influência desses danadinhos, existem ferramentas que permitem nos aprofundar e reconhecer cada fase cíclica do nosso corpo. No sagrado feminino, o útero é vibração, poder, energia e coração. E a menstruação é vista com a morte simbólica do ciclo. Aqui, dividimos ele em 4 fases: Pré-ovulatória, Ovulatória, Pré-menstrual e menstrual.


Cada fase possui um arquétipo que a representa. Arquétipo é um conceito da psicologia que representa comportamentos associados à um personagem ou uma fase. Lua Menezes diz:

"Essas fases condensadas no microcosmo do ciclo, representam fases da nossa vida como mulher".

Não são figuras inventadas, mas percebidas no seu interior. E como em cada mulher existe um universo em expansão, existem certas coisas que só você pode saber e fazer por você. Não dá pra extrapolar tudo para todas. Quando a resposta não se encontra conhecimento tradicional, ela está no intrínseco, ou melhor dizendo, dentro de você.


Sabe quem tem também tem 4 fases? A lua. E no sagrado nós acreditamos que essa ciclicidade guia nossas fases e nossos corpos assim como guia os plantios e as marés, por exemplo. O corpo humano tem entre 60 e 80% de água (varia com a idade). Se a lua influência as águas do planeta porque não as nossas? Cada fase* lunar exerce um tipo de influência sobre nosso comportamento, personalidade, humor, libido, energia e criatividade. *Nem sempre as fases correspondentes da lua estarão em concordância com o nosso ciclo. Faz parte do processo e traz respostas também.

Conheça os Arquétipos da Deusa:


Pré-ovulatória – Arquétipo da donzela (Lua crescente)

É como a primavera em expansão. Florescente, doce e criativa. Guarda a energia sexual, indomável, insurgente. É a fase de criação de projetos, de experimentar, da coragem e do fortalecimento da independência e autossuficiência. É tempo de agir e semear. Às vezes me sinto invadida por um turbilhão de ideias. Impulsiva, destemida e obstinada. Sinto que posso conquistar o mundo todo e foda-se quem não acredita nisso. Contém doses de imaturidade.

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Ovulatória – Arquétipo da mãe (Lua cheia)

O nome mãe não precisa te assustar. Gerar e nutrir nem sempre estão associados a colocar uma nova vida no mundo. As mulheres parem todos os dias. Projetos, ideias, sonhos. Nessa fase, se intensifica o instinto de cuidar, proteger e acolher. É verão, tempo de colher o que foi semeado, de usufruir da energia sexual vibrante e espalhar luz. É uma fase propícia para se reconectar com as pessoas. É possível doar, mas também receber. Existe um ideal de que a ovulação seja o ápice do ciclo (hormônios, feromônios e sensualidade em alta). A verdade é que todas as fases têm luz e sombras e estão suscetíveis a flutuações internas. A ovulação pode vir acompanhada de dor, estresse e choro. Dor por não criar, não parir seus projetos pro mundo. Algo não está fluindo e se a gente não aceita isso, fica exposta ao bloqueio e a frustração. É preciso pensar além do estereótipo de abdicação total materno. Você pode usar essa energia pra você. Sinto prudência, responsabilidade e planejamento. Acredito no propósito de vida e sinto ter capacidade de conduzi-lo.

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Pré-menstrual - Arquétipo da feiticeira (Lua minguante)

O desafio. É você em uma versão expandida. É uma fase mais introspectiva, de recolhimento e reflexão. É outono, tempo de encarar as sombras e abrir espaço para a transformação, que é logo ali, na próxima lua. É possível trazer luz para escuridão, se acolher e curar feridas abertas. Tempo de conectar-se profundamente com seu interior, a natureza, o místico e o oculto. Tempo de reconhecer que certos padrões não te cabem mais. Pode ser usado com sabedoria para encerrar coisas difíceis. Se menstruar é morrer simbolicamente, a feiticeira é o que vem antes dessa morte. Portanto, você tem menos paciência e menos tempo a perder.

As emoções podem (e vão) gritar. Por isso é a fase de identificar seus limites, desejos, processos ocultos e inacabados. Na fase da mãe, você se doou porque quis ou porque se sentiu pressionada? A feiticeira revela tudo para a anciã levar embora. Basta ouvir e aprender a dizer não quando for preciso. Sinto que as pequenas coisas viram terremotos.

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Menstrual – Arquétipo da anciã (Lua nova)

A bruxa sábia vem transformar. Conhecedora ancestral dos mistérios da vida, da cura e da morte. É inverno, correm as águas que limpam e purificam. Aqui ocorrem as transformações que foram pedidas na fase anterior. Tempo de deixar ir, desapegar do que é antigo e não te serve mais. Tempo de silêncio profundo. Se você quiser, não restará pedra sobre pedra. Ciclos difíceis tendem a trazer mortes difíceis. Se você se sente assim, tente se perguntar contra o que você está lutando, o que está resistindo de deixar ir. Aceita e acolhe a morte. Sinto carência, sensibilidade, amorosidade e a sexualidade. Sei o que preciso fazer, mas sinto como é difícil desapegar. É chegada a enxurrada que leva os sintomas e processos correnteza abaixo. Choro as perdas. Se o ciclo foi tenso e traumático, isso pode refletir em inchaços, cólicas, enjoos, e dores de cabeça.

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Gosta de fazer testes? Que tal um sobre qual Deusa te rege? Se fizer compartilha comigo. https://www.terra.com.br/vida-e-estilo/infograficos/esoterico/deusas-gregas-qual-a-sua/quiz.htm

Um ciclo perfeito! E falar disso com leveza não significa que eu sei lidar totalmente com as minhas oscilações. Eu me observo e mesmo assim ainda me desrespeito. Escuto e ignoro. Me culpo por não estudar determinadas coisas, por não ler como antes, por não observar todos os dias os meus sintomas, ou simplesmente por relaxar. As oscilações são naturais e acolher isso gera auto-respeito e auto-amor. O negócio é fazer o que você consegue e quer fazer. Tendo sempre em mente a motivação verdadeira por trás disso: eu não quero fazer ou eu estou me autossabotando? Eu quero ou estão me pressionando? Só você pode se ouvir e responder. Seu cuide, tenha pequenos momentos a sós com você. Um banho relaxante, admirar o por do sol, um escalda pés, um ritual.

Hoje eu percebo que perdi muita coisa. Menstruar acendeu de volta pequenas chamas a muito apagadas em mim. Eu voltei a dançar, a pintar, a escrever, estar presente, a olhar com poesia para as pequenas coisas. A experimentar e a reconhecer o selvagem em mim. Tento sempre alimentar minha criança interior. Em contrapartida, trouxe coisas novas para lidar: como espinhas, oleosidade e explosões emocionais.

Descolonizar o ódio sobre nosso sangue também é um avance político. Representa deixar antigos padrões limitantes e se abrir para novos caminhos de prazer e abundância. Sei que essa não é uma realidade acessível para todas. Recentemente eu me questionei: Quem minha concepção do feminino alcança? Alcança a mulher que só consegue se manter no AC? Aquela com problema e/ou síndrome que talvez nunca tenha uma relação íntima com o sangue menstrual? Quero te dizer que, independente de qual é seu tipo de contracepção, fazer as pazes com seu sangue é poderoso demais.


Não se afaste da ciclicidade. Talvez você não consiga acompanhar seu muco, seus arquétipos, plantar sua lua; mas ainda existem inúmeras ferramentas e rituais que você pode vivenciar do seu lugar/espaço. Sempre existe um meio de você se reconectar, mesmo que não seja o mais óbvio. Você vai encontrar suas próprias ligações. No sagrado, os rituais são como ferramentas de reencontro. Deixarei algumas aqui relacionadas com nossos ciclos e se vocês quiserem, podemos conversar sobre elas depois.

Cinco ferramentas de autoconhecimento e observação


1. Livro dos sonhos para escrever quando acordar e encontrar padrões escondidos no . subconsciente;

2. Diário de uma pergunta por dia para entender sua visão de mundo e a evolução dela (tem livro físico e app);

3. Mandala lunar para conectar seu ciclo e oscilações com as fases da lua;

4. Meditação e oráculos para te auxiliar a ouvir sua intuição (e consequentemente obter respostas);

5. Percepção da fertilidade para reconhecer os sinais do seu corpo durante as fases cíclicas (app ou anotação).

Cinco rituais de conexão com seu feminino e ancestralidade


1. Cura pelas ervas (banhos energizantes, escalda-pés relaxantes, conexão através dos chás, vaporização uterina, banhos de assento, dentre outros);

2. Dançar para aterrar e vibrar com o mundo. Ajuda a “liberar” o sangue e no alívio das cólicas;

3. Alongamentos e yoga ( exemplos de posições: da criança, do cachorro, flor de lótus, deusa inclinada, da mariposa e pinça) para aliviar as tensões das cólicas e inchaços;

4. Plantar a lua para se reconectar com as ancestrais, devolver seu sangue e nutrir a Terra, retribuindo seu desenvolvimento e colheita;

5. Benção do útero para elevar a vibração, reconhecer a força, acordar aspectos adormecidos da sua divindade e celebrar o seu sagrado feminino.

Vou deixar o link* de um livrinho sobre ginecologia natural que é muito útil e enriquecedor (pra mim) no sentido de cuidar naturalmente de sintomas e de "bucetites" que nos acometem. *Se você não se conectar com gmail, precisará de uma autorização. Me avisa que libero. No fim tem algumas sugestões/ leituras recomendadas.


Numa sociedade linear, ser cíclica é um alívio. Viva suas fases. Exercite estar presente. Quanto mais você mergulha no seu conhecimento, mais autonomia você tem. Desperta essa Deusa! E lembre-se sempre da máxima menstrual que diz: "Aceita que dói menos!" Com amor, Tai


Nota mental: Uma reflexão suscitada por @lascivaluaaa e @beatriz.sabo: Parece que temos um bloqueio imposto na nossa criação que nos impede de sonhar. Qual o seu sonho? Você pode fazer muito mais do que eles disseram. Tudo que você quiser.


Fontes/leituras recomendadas: Sugestão de app que une ciclo menstrual, fases da lua e arquétipos: Lunar app Mandala lunar: https://www.mandalalunar.com.br/arquetipos-do-ciclo-menstrual/ https://www.eusemfronteiras.com.br/arquetipos-deusas-fases-da-lua/

Livro Mulheres que correm com os lobos - Clarissa Pinkola Estés

Livro Lua vermelha - Miranda Gray

Podcast talvez seja isso - Spotify

Podcast Lasciva Lua - Spotify e Youtube

Imagem 4: Radek Skonieczny Imagem 5: www.lapachamama.com.br Imagem 6: Chana de Moura



3 Comments


Verônica Calumby
Verônica Calumby
Jul 10, 2020

Já tivemos tantas conversas sobre este tema né Tai? Fiz as pazes com meu sangue tardiamente (mas antes tarde do que nunca né?), levei 21 anos (mal)acompanhada pelos AC's, Mas o chamado e a conta veio, e foi uma Re-menarca, pq fiquei mais tempo sem menstruar do que menstruando! Meu reinicio foi ano passado, um ano divisor de águas, de arquétipos, de ideologias, de mudanças muito profundas e que me fizeram e estão fazendo um enorme bem. Resolvi colocar o DIU de cobre, a princípio estava super bem, mas de fevereiro para cá tenho sentido muitas dores, caso com melhores, já pensei em tirar :'( Quanto a menstruar em si, estou super de boa, quero experimentar o coletor! Texto excelenteeeee <3

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Tai Cruz
Tai Cruz
Jul 06, 2020

ohhh amiga, eu que agradeço por estar aberta pra isso <3 Vamos juntas!

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erica_oliviery
Jun 27, 2020

A senhorita já tinha dado um boo na minha mente essa semana e HOJE me fez mais reflexiva e claro aprendendo mais e mais. Gratidão! E escrita deliciosa com uma alma, e que envolve do começo ao fim😍

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